As rochas são arquivos que relatam a história da Terra.
Através do seu estudo pode-se ter acesso às condições climatéricas em que se geraram, à composição da atmosfera, à química da água. Pode-se ainda recolher dados acerca da repartição dos continentes e oceanos e à fauna e flora existentes na altura da sua génese. Todas estas informações conduzem-nos à idade relativa das rochas, estudada pela Estratigrafia. Este estudo é maioritariamente realizado em rochas sedimentares, por apresentarem, habitualmente, estratificação e serem frequentemente fossilíferas. A fácies sedimentar de uma rocha (características texturais, mineralógicas, químicas, paleonotógicas e estruturais) permite definir o ambiente de sedimentação da rocha, e assim reconstituir paleoambientes.
Muitas das estruturas que ajudam a desvendar as condições da sua formação estão preservadas nas juntas de estratificação (que separam um determinado estrato de outro devido a pausas ou interrupções na sedimentação). Exemplos disso são as marcas de ondulação, de gotas de chuva,as fendas de dessecação, as pegadas de animais.
Há que ter em conta que a reconstituição da história da Terra e da vida é feita com base no princípio das causas actuais, em que se pode explicar o passado a partir do que se observa no presente.
A datação relativa é feita a partir da posição relativa das diversas formações rochosas, e da possível presença de determinados fósseis. Os melhores fósseis para a datar terrenos são os fósseis de idade, assim chamados pela sua ampla distribuição geográfica e a sua pequena repartição estratigráfica, pois permitem uma localização aproximada no tempo da idade dos terrenos em que são encontrados, para além de que, quando encontrados em estratos separados geograficamente, permitem a suposição de que esses estratos terão, então, sido formados na mesma altura.
Esta cronologia relativa aplicada pela Estratigrafia rege-se por variados princípios, entre os quais:
- O Princípio da Sobreposição de Estratos, que diz que, numa série de estratos horizontais, um determinado estrato é mais recente do que o existente por baixo de si, e mais antigo que o que o sobrepõe (vindo completar o Princípio da Horizontalidade Inicial, que afirma que os estratos se depositam segundo um eixo horizontal)
- O Princípio da Continuidade, que estabelece uma correlação entre camadas localizadas em lugares, eventualmente, muito distanciados
- O Princípio da Identidade Paleontológica, que afirma um sincronismo entre estratos caracterizados pelos mesmos conjuntos de fósseis.
Estes fósseis podem ser de diversos tipos, de acordo com o processo de fossilização sofrido: a mumificação preserva os organismos, normalmente, na sua quase totalidade, envolvendo-os num meio asséptico, como é o caso do gelo ou o âmbar; a moldagem preserva a impressão do “esqueleto” do organismo; a mineralização incorpora as partes duras do ser nos minerais da rocha; as marcas fósseis são evidências da existência do ser que as deixou (pegadas, fezes).
Os fósseis são fundamentais para a reconstituição de paleoambientes, aplicando o princípio das causas actuais. No entanto só os fósseis de fácies permitem esta reconstituição, caracterizando-se por pertencerem a seres que viveram em condições de meio muito restritas.
É neste contexto que se inserem as trilobites, bons fósseis de idade. Tendo vivido durante uma Era inteira – o Paleozóico –, estes artrópodes marinhos são conhecidos pela abundância de fósseis que deixaram na Serra do Valongo. Esta evidência poder-se-à dever também à frequente muda de carapaças ao longo do crescimento do ser (que multiplica assim o número de vestígios). Para além de fósseis da espécie em si, ficaram também vestígios da sua actividade, como pistas de locomoção e fezes.
Apesar de haver evidências de uma génese da espécie comum à génese da região do Valongo (há cerca de 570 M.a. atrás), as trilobites só mostram o seu domínio em estratos que caracterizam os mares do Ordovícico. Este Período tem uma sequência de três formações, em que a primeira apresenta frequentes marcas de ondulação, que remetem para um ambiente marinho; a segunda (posterior) apresenta a maior diversidade de fósseis, principalmente de animais; e a terceira formação caracterizada por uma litologia que assinala uma grande glaciação que ocorreu no final do Ordovícico. O Silúrico é caracterizado por um clima particularmente frio, com depósitos com características glaciárias, a que se sucedem os estratos do Devónico, últimos terrenos de fácies marinha, com faixas estreitas e descontínuas que apresentam os últimos fósseis dos mares do Paleozóico do Valongo, entre eles, os das trilobites.
O Carbonífero é já caracterizado por sedimentos de fácies continental, com fósseis predominantemente vegetais e leitos de carvão (nascidos da variedade florística da zona na época).
A Serra do Valongo pode ainda ser caracterizada pela sua estrutura anticlinal, isto é, as forças tectónicas criaram uma dobra antiforma (com a concavidade voltada para baixo), que coloca a sequência estratigráfica do Câmbrico (mais antiga das formações) no núcleo. Para além disso, pode-se constatar que sequências do Câmbrico, devido a dobras menores, foram colocadas sobre o Carbonífero (último Período de que há registos estratigráficos relevantes).
Tais conclusões só podem ser tiradas, uma vez mais, pela aplicação de princípios como o da Identidade Paleotológica, tendo em conta o Princípio das Causas actuais e, mais uma vez, com a preciosa ajuda de fósseis de idade, como o são as trilobites do Valongo.
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